sexta-feira, 12 de abril de 2013

Nosso Amor de ontem

 

Alô, Anna?
Podiam se passar mais 20 anos e eu não esqueceria aquela voz, aquele sotaque. Foram três anos somente, mas fez meu coração disparar - num tempo em que não havia email ou redes social, internet então ninguém usava ainda.
Nesses três longos anos, houve dois recados na secretária eletrônica, e três ou quatro interurbanos rápidos.
Anna sou eu Lucca, preciso te ver, estou bem perto do seu escritório, posso subir?
De novo meu coração aos pulos, de novo adrenalina, e respiração ofegante, em segundos revivi cada detalhes daqueles dias, enquanto você tocava a campainha.
Eu estava sozinha, era hora de almoço, de pé quebrado e muletas fui abrir a porta. Nesse momento as recordações são confusas, mas nos abraçamos e nos sentamos no mesmo sofá, você segurou minhas mãos, seus olhos brilhavam e sorriam. Falamos de superficialidades, das coisas que aconteceram com nossas vidas distantes, os casamentos e filhos.
Pedi para você ir embora, implorei ao meu coração que não saísse de dentro do meu peito ainda, não agora, nosso tempo passou.
Deixei um bilhete na minha mesa e pedi um taxi por telefone, e sem saber para onde ou mesmo porque segui para o Café Beaga, e na varanda ao entardecer deixei que todos os momentos que vivemos juntos tomassem vida, só por agora, só por hoje voltei no tempo.
Meu dia não prometia nada demais, só pensava em dançar a noite toda, com Beth e Joana. Andava cansada da rotina, do escritório, mas era quarta-feira e as férias só no próximo ano ainda.
Embora fosse primavera o fim de tarde era agradável, me lembro de ter passado em casa depois do trabalho, e colocado um vestido.
Caminhei até o restaurante da Lucinha para jantar, as meninas já tinham chegado, rimos e nos distraímos por umas duas horas, Betinha inventou de jogarmos palitinho para ver quem pagava a conta. Na mesa ao lado dois caras riam das nossas brincadeiras, trocávamos olhares e cumplicidades.
Joana nem pensou duas vezes, puxou conversa e de repente estávamos todos jogando e rindo. Somente Luca não parecia muito à vontade.
Era hora de irmos dançar, a última rodada do jogo, para ver quem ia ganhar ou perder, eu ganhei e sai da brincadeira de primeira, os outros continuaram mas quando Lucca perdeu, seu olhar encontrou com o meu e eu fiquei sem palavras. Levantei da mesa e na volta do banheiro paguei a conta.
Quando chamaram o garçom e ele avisou que a conta estava paga, Lucca me encarou sem nem piscar e disse que não era certo. - Certo meu caro é quando faço o que eu quero respondi.
Nos levantamos e fomos dançar no Matita Perê. Cláudio e Betinha seguiram no carro de Joana e eu fui com Lucca para ensinar o caminho. Cariocas de passagem pelas Gerais.
Hoje tento me lembrar da música que tocava, mas a única lembrança é que era alta, quase não se podia conversar, dancei só um pouco, decidi ir embora, avisei Joana com um sinal e sai para a rua. Pensei em voltar caminhando embora já passasse da meia-noite e antes mesmo de me afastar dois metros, Lucca me alcançou e me ofereceu uma carona.
Pra falar a verdade eu queria mais que isso. Ouvimos música no carro, estava tocando Yanni, era 1995. Abri a garagem e entramos, com a porta aberta dançamos juntinhos.
O que vivemos depois daquela dança nos quatro dias, quatro noites que se seguiram foi intenso, revelador, desvairado e único, conversávamos, caminhávamos de mãos dadas, riamos, nos entregávamos ao amor insano que nos consumiria em cinzas.
Dentro de algumas horas não nos veríamos mais, e não pude deixar de contar os minutos, desperdiçando esses últimos momentos com pensamentos de despedida. Tanta coisa que faltou te dizer, as promessas que calamos, odeio a razão que me joga na água fria, ser feliz tinha um preço pagável, mas não corri riscos por amor.
E se eu soubesse, teríamos dançado a nossa música ainda uma vez mais.
Mas o nosso destino não se cumpriu!
Abro hoje sua carta, suas últimas palavras, dessa vez não vou deixar para depois, alegria, a saudades, a dor ou tristeza. E se for preciso vou chorar, sorrir e te amar outra vez.

Anna, Meu amor
Se eu pudesse mudar algo na minha vida teria sido o momento que fiquei sentado naquela mesa sem coragem para correr até você e te pedir pra ficar comigo, ou que desistiria de tudo para dar uma chance ao amor.
Estou deitado nessa cama há semanas, me disseram que é grave, tenho poucos momentos de lucidez, vivo num estado de torpor e delírios, as vezes acho que são sonhos somente.
Quanto me arrependo do amor que pelo qual eu não lutei.
Nem vou perder tempo tentando explicar ou me desculpando, sinto que será difícil demais e que dessa vez não tenho forças para seguir adiante.
Ultimamente só me lembro dos dias que passamos juntos, a cada dia que eu acordo agradeço por ter mais um dia revivendo o amor que tive.
Meu amor, amor, amor, seu perfume entrou pela janela agora, e eu deixo você entrar com o sol quente da manhã. Querida não existe aquele deus que te falei, não existe nada a não ser o que vivemos.
O meu tempo acabou, e não suporto mais nenhuma cirurgia, sinto esgotar minhas forças. Sei que não posso te chamar para estar ao meu lado, é tarde demais!
A promessa que você me fez de segurar minha mão e andarmos pela praça, e de envelhecermos juntos; não posso ajuda-la cumprir.
Mas hoje vou dizer o que mais me arrependo de não ter lhe dito, para me perdoar, no dia que foi a última vez que senti seu perfume e ouvi sua voz:
Sim, eu vou! Vou com você para todos os lugares ou para lugar nenhum, não importa, quero me casar com você, com sua alma e viver nosso sonho. Quero que você se case com meu coração e minha alma.
Quero te beijar sob as estrelas que você me descreveu nas noites escuras nos mares desertos.
Mas não me espere mais, guarde meu amor que é a única coisa que posso te dar.
O beijo que te deixo que será sempre seu

Lucca
PS: Adeus , e eu te amo seja lá onde estivermos.

Luca faleceu na terceira cirurgia, depois do acidente, na porta do restaurante, quando saiu correndo na direção oposta que tomei . Eu só vim saber da sua morte um ano depois, quando sua carta chegou em minhas mãos.
Não existem mágoas ou arrependimentos, vivemos o que escolhemos viver. Guardo pra mim a mais linda história de amor que tive a sorte de viver.

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